A mulher do fado já usou xaile. Já cantou com as mãos nas ancas. Emborcou álcool em copos sem fundo para afogar mágoas passadas. Gritou poemas populares de poetas antigos. Fez sonhar homens ébrios que falavam alto e batiam na mesa. Cantava em caves escuras em cima de palcos podres. Tinha peitos enormes que quase saltavam para fora. Pele enrugada testemunha da dificuldade de viver. Já usou um buço requintado. Teve barbela, mãos grossas e a sua voz rouca cantava a vida.
Hoje, a mulher do fado é bela, e faz por ser bela. Orgulha-se da sua beleza e procura mostrá-la ao mundo sem complexos. Usa vestidos da moda. Cuida da linha e só bebe água com sabores. Tem um corpo cuidado e classe no seu olhar.Tem uma voz límpida e uma alma pura. Canta em sítios confortáveis. Canta poetas do seu tempo. Deixou de ter buço.Tem pescoços finos e mãos delicadas. Estão mais belas, e dá mais vontade de ouvir fado.
Há tradições que se perdem com as mudanças do tempo. A(s) mulher(es) do Fado já não são o que era(m).
Felizmente, acrescento eu.
PS.1ª imagem- Quadro de José Malhoa. 2ª imagem - Fotografia de Joana Amendoeira, Raquel Tavares e Ana Moura.
3 comentários:
Bom, o aspecto dos fadistas mudou, de facto, mas não foi isso que me levou a dar uma oportunidade a este género musical.
Acho que as músicas, embora ainda com muito sentimento e saudade, tem uma energia nova e não são carregadas de pessimismo. As vozes são mais apaixonantes.
Confesso-me uma completa apaixonada pelos discos da Ana Moura, mas a Joana Amendoeira não fica nada atrás. Só conheci a Raquel Tavares depois de ter participado no "Dança Comigo" e tenho ouvido muito boas críticas do seu trabalho.
Que coincidência, adoro esse quadro do Malhoa! E boa analogia, sim senhor! =)
Eu, apesar de alfacinha de gema, até há bem pouco também não lhe dava a atenção merecida.
Projectos actuais como A Naifa e filmes como o "Fados", do Saura, têm-me reaproximado deste género musical da minha cidade. E é bom vê-lo de cara lavada e cheio de projectos de exportação. :)
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