21 de junho de 2010

Um simples obrigado

Foto : Marcos Borga


"Não é verdade. A viagem não acaba nunca. Só os viajantes acabam. E mesmo estes podem prolongar-se em memória, em lembrança, em narrativa. Quando o viajante se sentou na areia da praia e disse: «Não há mais que ver», sabia que não era assim. O fim de uma viagem é apenas o começo de outra. É preciso ver o que não foi visto, ver outra vez o que se viu já, ver na Primavera o que se vira no Verão, ver de dia o que se viu de noite, com Sol onde primeiramente a chuva caía, ver a seara verde, o fruto maduro, a pedra que mudou de lugar, a sombra que aqui não estava. É preciso voltar aos passos que foram dados, para os repetir, e para traçar caminhos novos ao lado deles. É preciso recomeçar a viagem. Sempre. O viajante volta já."
in "Viagens a Portugal"



É tempo de sacudir a tristeza do nosso corpo, como se estivéssemos a limpar o pó à nossa alma. É tempo de recomeçar. De voltar às suas palavras. De voltar a sorrir, carinhosamente, com as suas frases.


O corpo, reduzido a cinzas, já não habita no nosso Mundo. Já não respira o nosso ar. Agora pertence a um lugar que conquistou com dignidade, muito trabalho e imenso talento. Pertence à eternidade que apenas os grandes génios conseguem alcançar.

Olho para os seus livros na minha estante. Conto-os. São onze. Desses, li mais de metade. Ainda me faltam cinco. Mais aqueles que ainda não comprei. Um dia, irei comprar a todos, prometi a mim num dia longínquo, depois ter fechado um livro seu. Volto a pegar neles, vejo alguns cantos dobrados e sorrio cúmplice de momentos só nossos.

A partir de agora, irei lê-los. Alguns, irei relê-los. Em silêncio. Em segredo. Para que pareça que as suas palavras sejam só minhas. Para o recordar, como se deve recordar todos os grandes escritores.

Neste mundo de incoerentes, irei ter saudades da sua coerência, da sua frontalidade, de não ter medo de dizer a verdade, apenas porque ela é a sua convicção, mesmo que pareça ser só ele a defendê-la.

A partir de hoje, a tua viagem recomeçou. As minhas palavras serão sempre pequenas demais para a grandiosidade do que deixaste. Apenas, um simples obrigado.


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